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Projetos Pessoais: Quando a Necessidade Encontra a Criatividade — Minha Experiência Real com Tecnologia e Inteligência Artificial

         Um dos momentos mais marcantes da minha vida profissional aconteceu enquanto eu trabalhava em um mercado de grande porte. Por mérito e dedicação, fui promovido para a área de TI, e isso abriu portas para um novo mundo de aprendizado. Mesmo sem ter autonomia absoluta — já que muitos serviços eram terceirizados — tive acesso a uma rotina que incluía montar e desmontar computadores, configurar terminais de caixa, entender redes internas e resolver problemas operacionais do dia a dia.

        Eu não podia mexer fisicamente nas impressoras, pois havia uma prestadora externa para isso, mas já configurava IP, trocava cartuchos, abastecia papel e alinhava pequenos ajustes internos permitidos. A parte mais desafiadora não era técnica, mas organizacional: adaptar-me a um setor onde muitos não entendiam o que TI realmente fazia. Para algumas pessoas de outros setores, éramos “vagabundos” por não ficarmos correndo fisicamente pelo mercado, sem perceber o quanto TI sustenta toda a operação.

O problema real que desencadeou o projeto

       O mercado enfrentava um dilema sério no setor de câmaras frias, também conhecido como “setor dos Frios”. Existia uma norma interna — e até recomendações legais baseadas em saúde e segurança do trabalho — que determinavam o tempo máximo que um funcionário poderia permanecer dentro da câmara fria, bem como o período de descanso fora dela.

       O motivo disso é claro: exposição prolongada ao frio pode causar danos à saúde, incluindo problemas respiratórios, articulares e até risco de hipotermia. Isso está relacionado a normativas como a NR-17 (Ergonomia) e a NR-36 (Atividades Frigoríficas), além de princípios previstos na CLT, artigo 157, que obriga o empregador a garantir condições adequadas de trabalho, segurança e saúde.

      Aconteceu que um ex-funcionário entrou com um processo alegando descumprimento dessas normas. E ele venceu a ação. A empresa foi condenada, porque não havia um controle preciso de entrada e saída da câmara fria — apenas uma placa que orientava o tempo máximo permitido. Orientação sem registro não tem valor jurídico.

       De repente, o setor onde eu trabalhava virou o foco. Meu líder recebeu a responsabilidade de criar algum tipo de controle eficiente, prático e auditável. Ele tentou buscar sistemas prontos em outras filiais e até conseguiu um arquivo, mas não sabia instalar ou configurar um servidor local (XAMPP), e havia o obstáculo clássico: programas só poderiam ser instalados com autorização da matriz. E isso, em empresas grandes, vira uma novela sem fim.

O nascimento de uma ideia — e o avanço graças à inteligência artificial

      Foi aí que entrou algo inesperado: a inteligência artificial, recém-lançada naquele período. Eu já explorava o ChatGPT para estudos da faculdade, e comecei a experimentar seus limites, como descrevi em capítulos anteriores. Mesmo limitado naquela época, ele já conseguia direcionar caminhos, sugerir estruturas e ajudar a esboçar soluções.

       Como instalar o XAMPP era proibido, pensei: “Vamos fazer o sistema com o que temos”. Havia um HD interno compartilhado entre todos os computadores — funcionava como um mini repositório. Decidi usá-lo como base para o projeto.

        Assim, criamos uma aplicação simples, mas funcional, usando:

  • PHP para lógica de backend;
  • HTML e CSS para interface;
  • JavaScript para interatividade;
  • XML como base de dados local, já que não podíamos instalar MySQL.

        O sistema permitia cadastrar funcionários e registrar entradas e saídas do setor dos frios. Quando um colaborador excedia o tempo permitido, um alerta sonoro era disparado — audível por toda a equipe. Isso permitia que o líder monitorasse a situação em tempo real e evitasse novos passivos trabalhistas.

     E o mais importante: criamos relatórios digitais para comprovar auditorias internas, em caso de futuras investigações, fiscalizações ou processos.

Quando a persistência supera a falta de recursos

     A equipe estava desmotivada. Alguns desistiram no meio do caminho. Outros achavam impossível criar algo sem servidor, sem autorização e sem ferramentas avançadas. Mas a falta de recursos nunca impediu o nascimento da criatividade.

      Com persistência, improvisação e muita pesquisa — e sim, com a ajuda de IA — criamos um sistema funcional, que ajudou o setor e trouxe segurança jurídica para a empresa. Tudo isso sem gastar um centavo, usando apenas conhecimento técnico e a capacidade de adaptar-se.

O impacto legal e organizacional do projeto

         Mais do que um projeto de TI, aquilo foi um projeto de proteção ao trabalhador e de segurança jurídica. A partir dele, a empresa passou a ter:

  • registro documentado de entrada e saída;
  • provas para auditorias e fiscalizações;
  • controle de exposição ao frio, conforme NR-36;
  • evitação de novos processos trabalhistas;
  • melhoria na gestão do setor.

    Pela primeira vez, percebi o poder de um projeto pessoal simples, mas bem direcionado: ele resolve problemas reais, gera impacto imediato e transforma a forma como as equipes veem o profissional.

O que esse projeto ensinou sobre carreira e aprendizado

       Esse episódio foi um divisor de águas na minha vida. Descobri que:

  • projetos pessoais são mais valiosos do que qualquer curso;
  • a IA é uma aliada, mas não substitui o raciocínio humano;
  • criatividade supera falta de recursos;
  • pequenas soluções resolvem grandes problemas;
  • TI é muito mais do que “mexer com computador” — é pensar sistemas.

         Foi ali que entendi o verdadeiro poder do desenvolvedor: não está na ferramenta, mas na capacidade de criar soluções onde ninguém vê solução. E foi também nesse momento que percebi que a inteligência artificial não tira empregos — ela amplia o que somos capazes de fazer.

Conclusão: um projeto simples, um impacto enorme

          O sistema que criamos com PHP, JavaScript e XML não era o mais bonito, nem o mais moderno. Mas funcionava, resolvia um problema grave e atendia a uma necessidade legal. E isso é o que realmente importa em tecnologia.

         Hoje, olhando para trás, vejo que esse foi um dos projetos que mais moldou meu entendimento sobre TI, legislação trabalhista, IA e o poder do improviso criativo.

        É essa mentalidade — de enfrentar limitações e criar soluções reais — que forma profissionais completos. E foi exatamente esse tipo de experiência que me preparou para os próximos capítulos da minha vida.